Carrego na pele a marca da
mudança. Cicatrizes, tatuagens, estrias e rugas. Já foi-se o tempo da vergonha.
Não é orgulho por cada sinal mas aceitação. Me perguntaram não há muito num
flerte duvidoso quem eu gostaria que aparecesse nu na minha casa. Nada sexual,
nada ofensivo. Alguém que eu simplesmente gostaria de ver inteiro. Olhar e
partir. ‘Eu mesma’, pensei. Adoraria me ver. Não num reflexo, não numa imagem.
Com meus olhos, a minha frente. Tocaria minha própria pele e sentiria meu
cheiro e então quem sabe entenderia todo aquele lance que ouvi este mesmo alguém
repetir sobre meu corpo. Escreveria sob minha pele cada palavra que agora
escrevo aqui. Deixaria no braço direito as de maior aprendizado, coxa interna
todas as juras de amor e nas costas aquilo que já ficou pra trás. Mas este segundo
corpo não existe então eternalizo, a minha maneira, o que posso por aqui. Aqui,
no diário, em banheiros públicos, em mensagens de madrugada que dizem sempre
menos do que queria mas ainda assim sempre são enviadas. E meu favorito: dentro
de livros. Para desconhecidos em livrarias ou numa coleção pessoal que sempre faço
questão de elogiar. Palavras, rabiscos, um sublinhado que rouba a ideia alheia
mas expressa tão bem tudo que sou e quis lhe dizer. Palavras de outro, mas
sentimentos meus. Eu, meu, meus. Egoísta, claro. Já falei isso aqui antes:
viajo/vivo por ego. Não quero ver as coisas, quero que as coisas me vejam. Mas ei,
pelo menos eu reconheço.