quinta-feira, setembro 21, 2006


- levante e arrume seus erros, antes que tudo se transforme em pó.
ele adorava essa palavra "pó", a pronunciava de modo tão natural. era quase perfeita. se combinavam.
eu o via morder sua maçã, e tirar aquelas fotos horríveis sempre que o olhava de soslaio. eu sorria tentando fazer um charme natural, algo que o fizesse entender que eu não queria me levantar, nem consertar nada. porque, na realidade, não via nada de errado.
- Laica, Laika..
era assim que ele me chamava. nunca pelo nome, jamais. acho que o sotaque o impedia de pronunciá-lo corretamente. era Laika. ora com "c", ora com "k", e isso eu aprendi a deduzir sozinha.
quando ele gargalhava, era sempre com "c", e também quando me beijava e quando inventava uma música só para mim.
- Laica, Laica.. i love you, but we're going home.
sempre algo bobo, dizia que nosso vocabulário pessoal devia se limitar a pequenas frases. essas eram suas favoritas.
ele passou mais tempo do que me lembro dizendo para ir, eu ria, dizia que não me importava, ele sorria. voltei a ler.
"dolores chiozza aproximou-se dele. ela usava um traje inteiriço de pantalonas de veludo verde, com uma faixa comprida, de franjas douradas, fazendo as vezes como cinto. ela fazia girar a ponta como se você atirar um laço. ela deu um sorriso breve, artificial. seu rosto tinha uma aparência recém-lavado e suas pálpebras estavam azuladas e estreme-ciam quando ela piscava.
steve levantou-se e observou o chinelinho verdes, marroqui-nos, aparecendo e desaparecendo sob as pantalonas a medida que ela caminhava. quando ela chegou perto dele, ergueu o olhar para o rosto dela e disse, estupidamente:
- oi. [...]"
ele ligou o som.
"what does my heart feel so bad..?"
não consigo lembrar da última vez que ouvimos esse disco.
"what does my soul feel so bad..?"
escutei a porta..
encostei o livro. uma lágrima. duas lágrimas. me levantei da cama, desci a escada, me sentei no últmo degrau e esperei. (...)

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fica o que não se escreve.